A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

17 de dezembro de 2018

erres


arrancar os ERRES da garganta
arranhar o gosto gasto da traquéia
com o mar que arde nas entranhas
agarrar os erros
engasgar com o rastro desta letra
o ar que arfa as arestas do incontido
raspa a ferrugem das cidades frias
marca com palavras cruas
o incêndio das ferragens retorcidas
ruas, postes e avenidas
cicatriz marcando cada esquina
a escrita encravada nas profundas grutas
a vertigem virgem entre as margens
as palavras brotam brutas
máquinas abruptas produzindo espanto
fábricas perdidas arranhando o tempo
o silêncio produzindo o vento
noturnas engrenagens ruminando
o marasmo gasto dos esquecimentos
a escrita escorrendo pelos poros
magma
esperma
porra
escarro
o silêncio rosna entre os dentes
 
Salvador Passos