queria ter os braços longos
para abraçar a chuva que cai sobre cidade
não os tenho
por isso estico as palavras como retas paralelas
encontro a eternidade nas palavras passageiras
consulto novamente o dicionário
como quem aprende uma língua estrangeira
estou à margem das palavras e do mundo
por isso estico os braços
como quem procura apoio
estico os braços como quem se afoga
e busca uma boia
chove na curva da palavra
há um refúgio nos dizeres das palavras
uma morte implícita na poesia
o ar se arrasta sobre a cidade lentamente
um vento frio
os relógios marcam horas repetidas
é sexta feira e chove
e o tempo já não basta para dizer tudo o que resta
os relógios marcam as mesmas horas
que marcavam sexta feira da semana passada
e a chuva cai sobre a cidade virgem
arrasta o lixo e a urina pelas ruas
já posso sentir o cheiro de urina em cada praça
nas linhas do poema o almíscar azedo invade a suposta civilização ocidental
cerveja e a urina misturados pela chuva no poema
o relógio marca horas repetidas
como o poema que usa sempre as mesmas palavras
buscando imagens novas
Salvador Passos
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