A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

31 de outubro de 2018

eterna noite das palavras

amarrei palavras entre as horas
encostei na curva do poema

entre as tardes cegas agarrei imagens
as tvs abandonas se transformam em aquários mudos
esbarrei nos ventos
ecos soltos de embaralhar cabelos, saias
solavancos

tropeço nas palavras

de noite,
mariposas se revoltam ao redor das chamas
& morrem dentro dos armários
nas gavetas
feito sílabas solares
metafísica de vidro
rodam pela madrugada
tingindo o poema
com a insônia de ícaro
na eterna noite das palavras

Salvador Passos

dança tectônica

trago na voz a munição lírica dos escombros
queria arquivar a aura ausente das cidades
seu sangue aguado
não posso reviver o culto que sangrou um dia nas palavras
há um aparato cinematográfico que multiplica sombras
espelhos transplantados
corpos exilados
rostos replicados

as palavras foram domesticadas
& seus nomes esquecidos

há um rio que escorre sob nossos pés
sua turbulência foi drenada
(leito transformado em pedra)

a cidade dança sua dança tectônica
adormecem fósseis
no sonho das lembranças soterradas
o fogo foi petrificado no olhar noturno da medusa
flores esquecidas
aprendem a dança do carbono

Salvador Passos