1 de outubro de 2025

Sempre

 E sempre que vier a dor do ser

revirá o último cuspe, sabor de osso

a remoer o sonho

sempre que souber de quem lutara

nas guelras de mal dormidas batalhas

e no rilhar dos dentes se afogara

em meio a poentas e estúpidas mortalhas,

desse modo, e sempre que houver palavra

a ser cuspida por entre tanta ausência

e pelo humano pó de uma qualquer estrada

onde mortos se enovelam pelas selvas

de sementes e feras apagadas,

este estampido cego, o absurdo oco

de que me valho para que, pouco 

a pouco, o poema se esvazie do carretel

de fúrias e no tempo perfaça. ovo

ainda mais vazio no vazar da espuma, 

bile diária de quem perdeu o sonho. 

inútil luz de sol sotoposto, último

agosto de um violino a arder o oculto rosto

 

Pois sempre inodora a flama que desdenha

de uma aurora que não mais desempenha

 

Afonso Henriques Neto 

 

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