São postados textos, fotos, poesias...
A apresentação é:
"Em todo o mundo vivemos uma democracia grega. Aos incluídos as maravilhas conquistadas nesses tempos modernos. Os excluídos não participam das conquistas da sociedade urbana. O blog é um convite a esta reflexão."
A REGULAMENTAÇÃO DE UM ESTADO DE EXCEÇÃO
Edmar  Oliveira  
 A notícia saiu na sexta-feira, 17, quando os blocos  de carnaval já tomavam as ruas para a nossa festa maior. Dizemos até que o ano  começa depois do carnaval, justo quando escrevo esse texto chamando atenção para  a notícia que foi perdida nos desfiles carnavalescos.
 A Comissão de Assuntos Sociais do Senado se prepara  para votar o Projeto de Lei de número 111/10, que permite a “internação  compulsória” do usuário de drogas, bastando para isso apenas a autorização de um  “laudo médico”. A proposta do Projeto de Lei (PL) foi apresentada por um senador  do DEM, que previa originalmente a prisão do usuário. Dois outros senadores da  oposição “melhoraram” o texto original trocando a prisão pela “internação  compulsória”, num ato falho que expõe o caráter repressivo do recolhimento. Mas  grave ainda é a avaliação dos senadores para a facilidade da aprovação do PL, já  que o Ministério da Saúde autoriza a “tese” (sic), na interpretação dos  políticos de oposição às recentes declarações do Ministro da Saúde sobre o tema.  
 Quero chamar atenção para dois fatos que se  completam, se tal projeto torna-se a Lei pretendida. Primeiro desfigura-se a lei  10.216/2001, que é a lei que protege o direito das pessoas com transtornos  mentais. Nela já se permite a internação INVOLUNTÁRIA, por ato médico, mas é  necessário ao judiciário determinar a internação COMPULSÓRIA, pois tal  instrumento necessita de processo jurídico, na forma da lei. Mesmo na internação  INVOLUNTÁRIA, a 10.216 obriga o internante comunicar ao Ministério Público, que  zela pela garantia dos direitos individuais, o que permite ao internado requerer  sua defesa, se sentir-se lesado. Portanto não são sinônimos, como às vezes se  quer fazer acontecer por má fé. A internação involuntária deve ser uma indicação  clínica extrema, e provisória, para um paciente que será assistido pelo médico  requisitante, conforme determina a lei, e com direitos de garantia de posterior  discordância do internado. Na internação COMPULSÓRIA, cessam-se os direitos  individuais e, por isso, a lei 10.216 exige um processo jurídico e determinação  judicial.
 A segunda consequência é trágica para o Estado  Democrático. Aprovado o PL 111 o Estado se coloca no direito de tirar o cidadão  das ruas, por uso de drogas, com o Recolhimento Involuntário de pessoas  indesejáveis à sociedade. Por isso os autores da “melhoria da lei” se traíram na  sua emenda. Não se troca “prisão” por “internação”. Mas “prisão” por  “recolhimento”, o que vem a ser o mesmo. E compulsórios, os dois.
 Para os mais jovens, conto um acontecimento vivido  por velhos. No Rio de Janeiro, durante a ditadura militar, uma clínica  particular da zona oeste tinha por prática recolher mendigos e bêbados nas ruas  da zona sul e, posteriormente, levar os recolhidos para obter uma “autorização  de internação” nos postos de saúde do antigo INAMPS (Instituto Nacional de  Assistência Médica e Previdência Social). Tais “autorizações” eram dadas por  médicos que trabalhavam na referida clínica, quando não eram sócios nessa  promiscuidade público-privada. Fazia-se dos desvalidos o lucro dos descarados.  Mas eram anos de chumbo. E essas práticas foram acabando com os ares, e  configuração legislativa, da democracia. Reclamávamos todos, os democratas, do  uso da Psiquiatria como prática repressiva de Estado, como acontecia no  stalinismo soviético. 
 Vivemos uma democracia que possibilitou nosso  crescimento enquanto nação. De fato o país vem crescendo e se desenvolvendo como  nunca. Para os incluídos. Aos excluídos urbanos a democracia pode estar  regulamentando um Estado de Exceção. Usando a Psiquiatria como instrumento  repressivo do Estado como se fez nas ditaduras. E isso é grave.  
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