A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

28 de janeiro de 2016

houston we have a problem

 "Ground Control to Major Tom
  Ground Control to Major Tom
  Take your protein pills and put your helmet on"     Sapce Oddity- Ziggy Stardust



 Desenho: Lourenço Mutarelli

do alto do vasto cosmos
espera o astronauta por outro buraco negro
fazendo seus experimentos
medindo a curvatura

da massa e do espaço tempo
seguindo os procedimentos
fazendo suas leituras
por meio dos instrumentos
espera que a massa entorte
o tempo do universo
seu tempo é coisa rara
tão pouco divertimento
não lê mais verso ou prosa
só lê os seus instrumentos
os lúcidos instrumentos
que medem o espaço tempo

não faltam-lhe mais amores
pois todos computadores
que sonham os sonhos dele
fornecem as doses certas
de impulsos eletro-eróticos
que imprimem no cerebelo
volúpias que alimentam
orgásticos apetites

silêncio no espaço é longo
quem dera ele escutasse
o peso da gravidade
quem dera ele lembrasse
do eco do verso morto

quem sabe chorasse aos prantos
se acaso ele lembrasse do baque do verso preso

nas grutas do pensamento
memórias de um tempo outro

se perdem no firmamento
os olhos do astronauta
só leem os instrumentos
que medem o espaço tempo
e perdem em meio aos dados
da alma humana os fados

no alto do espaço vasto
os versos são coisas mortas

não lembram ao astronauta
o som da rima rica
tampouco da prima pobre
nem mesmo o eco ecoa
na eterna eternidade


do alto do espaço cosmos
já foram-se os deuses todos
já foram-se os sonhos tortos
restaram só instrumentos
só números que enumeram
e dados que se aglomeram


palavras já não nos restam
agora só falam todos
na língua dos telepatas
descrevem exatos nomes
que nomes já não mais são
são coisas que dizem coisas
exatas na exatidão
só falam na exata coisa
que é dita quando se fala
queria o astronauta
as coisas que não se falam

os nomes inomináveis
das coisas que nunca disse
as coisas que não se medem
a fala que já se perde
e a perda que não se cala

do alto da lua salta
inédito o astronauta

tentando o suicídio
no vácuo da eternidade

coitado do astronauta
que para na vacuidade
do alto do seu suplício
esquece que a gravidade
não grava mais peso nele
esquece que o peso para
no alto do espaço morto


no vácuo ou no infinito
não medem os instrumentos
a busca que busca o homem
e falta aos instrumentos
a falta que falta ao homem
o homem é homem sempre
esquecem todos em houston


Salvador Passos 

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