31 de março de 2016

You are welcome to Elsinore

Entre nós e as palavras há metal fundente 
entre nós e as palavras há hélices que andam 
e podem dar-nos morte violar-nos tirar 
do mais fundo de nós o mais útil segredo 
entre nós e as palavras há perfis ardentes 
espaços cheios de gente de costas 
altas flores venenosas portas por abrir 
e escadas e ponteiros e crianças sentadas 
à espera do seu tempo e do seu precipício 

Ao longo da muralha que habitamos 
há palavras de vida há palavras de morte 
há palavras imensas, que esperam por nós 
e outras, frágeis, que deixaram de esperar 
há palavras acesas como barcos 
e há palavras homens, palavras que guardam 
o seu segredo e a sua posição 

Entre nós e as palavras, surdamente, 
as mãos e as paredes de Elsenor 
E há palavras nocturnas palavras gemidos 
palavras que nos sobem ilegíveis à boca 
palavras diamantes palavras nunca escritas 
palavras impossíveis de escrever 
por não termos connosco cordas de violinos 
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar 
e os braços dos amantes escrevem muito alto 
muito além do azul onde oxidados morrem 
palavras maternais só sombra só soluço 
só espasmo só amor só solidão desfeita 
 
Entre nós e as palavras, os emparedados 
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar 

Mário Cesariny

Nenhum comentário:

Postar um comentário