A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

22 de novembro de 2016

medusa mascarada

cidade
sopro aberto
corpo de artérias

carne claustrofóbica
berro de desertas vidas
veias
veios
rios
rochas cegas

chaga infectada
trincheira adormecida
miragem imolada
horizonte amputado
multidão insone tropeçando nas palavras
trens cheios de gente

medusa mascarada
serpente intocada do idioma alheio
infinita ilha babilônica
moinho de atrair delírios
 
argamassa elétrica de arrastar tragédias
epiderme tectônica 

ar que arranha o vidro
olho sem colírio
noturno monolito
ícaro de algum sol invertido

dédalo perdido 
arquitetura de gargantas mortas
engrenagem enferrujada
tarde gangrenada
sal que marca 
e arde na ferida aberta
margem que devora os mares
esperma de palavras brutas
lugar de exílio dos poetas

âmago inerte do quarto círculo do inferno
trânsito sonâmbulo do carbono

escafandros bruscos de perdidos hemisférios
mar que arrasta troços

e traz de volta 
os destroços do naufrágio
submersas multidões 

e o fôlego oprimido de tantas Áfricas  
 
Salvador Passos

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