A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

21 de maio de 2014

Contrapoemas

SÉRIE CONTRAPOEMAS

DESESPERANÇA

Manuel Bandeira

Esta manhã tem a tristeza de um crepúsculo.
Como dói um pesar em cada pensamento!
Ah, que penosa lassidão em cada músculo...
O silêncio é tão largo, é tão longo, é tão lento
Que dá medo... O ar, parado, incomoda,
angustia...
Dir-se-ia que anda no ar um mau
pressentimento.
Assim deverá ser a natureza um dia,
Quando a vida acabar e, astro apagado,
Rodar sobre si mesma estéril e vazia.
O demônio sutil das nevroses enterra
A sua agulha de aço em meu crânio doído.
Ouço a morte chamar-me e esse apelo me
aterra...
Minha respiração se faz como um gemido.
Já não entendo a vida, e se mais a aprofundo,
Mais a descompreendo e não lhe acho sentido.
Por onde alongue o meu olhar de moribundo,
Tudo a meus olhos toma um doloroso aspecto:
E erro assim repelido e estrangeiro no mundo.
Vejo nele a feição fria de um desafeto.
Temo a monotonia e apreendo a mudança.
Sinto que a minha vida é sem fim, sem objeto...
- ah, como dói viver quando falta a esperança!

Esperança – Poema novo construído por Rosana,
por meio da transformação em antônimos das
palavras do poema Desesperança, de
Manuel Bandeira.

ESPERANÇA

Essa noite não tem a alegria de uma aurora.
Como não dói um deleite em cada pensamento!
Ah, que agradável tensão em cada músculo...
O barulho é tão estreito, é tão curto, é tão rápido
Que dá coragem... O ar, em movimento, agrada,
tranqüiliza...
Dir-se-ia que se detém no ar um bom pressentimento.
Assim não deverá ser a natureza uma noite,
Quando a morte começar e, astro aceso,
Parar sobre os outros fecunda e plena.
O deus desajeitado das tranqüilidades desenterra
A sua agulha de aço em meu crânio são.
Não ouço a vida chamar-me e este não apelo me
encoraja...
Minha respiração não se faz como brado.
Já entendo a morte, e se menos a desarraigo,
Menos a compreendo e lhe acho sentido.
Por onde encolha o meu olhar de revigorado,
Nada a meus olhos toma um prazeroso aspecto:
E acerto assim acolhido e autóctone no mundo.
Não vejo nele a feição quente de um afeto.
Não temo o progresso e não apreendo a imutabilidade.
Não sinto que a minha morte não é finita, com objeto...
- ah, como é confortante morrer quando sobra a
desesperança!

Rosana Ricalde

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