A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

18 de julho de 2013



Da Carta Maior

Brasília – Matheus Preis, 19 anos, militante do Movimento Passe Livre (MPL), foi às mobilizações em São Paulo e à reunião com a presidenta Dilma Rousseff, em Brasília, vestido da mesma maneira: tênis e camiseta preta ilustrada com uma pessoa derrubando a roleta do metrô. Esse chute furioso é o ícone, ou um dos tantos surgidos dessa revolta que explodiu sem aviso.

O Movimento Passe Livre encabeçou as marchas paulistas do mês passado, onde ganhou credibilidade no movimento popular ao conquistar o que parecia impossível, a baixa do preço do transporte público.

Foi só o começo. Por trás das reivindicações contra o aumento do ônibus e do metrô, vieram as demandas por melhor saúde pública, educação, o repúdio à repressão policial, à corrupção e aos gastos na organização da Copa do Mundo. A faísca do MPL se transformou em incêndio. E embora Dilma não seja o principal alvo dos manifestantes que deixaram o país de cabeça para baixo, a aprovação de seu governo caiu verticalmente de 57 a 30%, segundo uma pesquisa aparecida sábado (13), e a reeleição já não é incontestável – sua intenção de voto baixou de 51 a 30%, segundo a mesma pesquisa.

– O desgaste do governo favorece a estratégia do MPL?

– Nós não queremos derrubar ninguém, não estamos metidos em uma disputa partidária ou pela conquista do governo. Nossa disputa é para que se apliquem outras políticas públicas, o que nós queremos é derrubar as injustiças... derrubar a exclusão.

– Dilma é uma companheira ou uma inimiga?

– Ehhh, enfim... depois da reunião que tivemos com ela na segunda-feira (8, no Palácio do Planalto), dizemos que no atual momento em que nos encontramos da luta pelo transporte, todas as propostas dela foram iguais às dos patrões. Queremos seguir baixando as tarifas com mais investimentos no transporte, chegar a zero, e ela o que faz é dar uma baixa na passagem reduzindo os impostos aos empresários, sem tocar nos lucros, isso não resolve nada.

– Veem diferenças entre Dilma Rousseff e o PSDB?

– Não são a mesma coisa, se o PSDB estivesse na presidência a repressão seria muito mais descarada, desavergonhada, a polícia viria abertamente atacar-nos, como fez no começo das manifestações em São Paulo. O PT é diferente do PSDB, o PT é contraditório, por um lado está contra a repressão e por outro lado apostou no desgaste de nosso movimento. O PT é menos duro que o PSDB na defesa dos patrões.

– Depois da reunião entre vocês e Dilma, o secretário-geral da presidência, ministro Gilberto Carvalho, declarou que não existe democracia sem partidos. Coincide?

– Minha opinião, não a de todo o MPL, é que não se necessitam partidos para que haja democracia. Partido se necessita para ter o poder de um Estado burguês, mas nós nos organizamos por fora da institucionalidade, os partidos obstruem nossa luta querendo amarrá-la aos seus interesses.

Não se precisa de um programa totalizante para lutar pelo transporte grátis, nós somos de esquerda, mas não partimos de uma visão totalizante para lutar pela passagem, damos a luta, e depois vamos ao ideológico – afirma o garoto da camiseta preta com o símbolo da roleta destruída, vestimenta que o iguala aos ativistas do MPL.

Talvez o Brasil não volte a ser o país que era depois de 15 dias de protagonismo popular primário. Há uma disputa aberta pelo sentido ideológico da revolta, no momento inclinada à esquerda, e o rumo político para onde marcham os milhões de indignados no Rio, Brasília, Salvador, Belo Horizonte e dezenas de cidades, depois de que o minúsculo MPL irrompeu como um raio na Avenida Paulista, a principal de São Paulo, catalisando a raiva pelo caro e ruim do transporte na maior cidade do país.

– A origem da revolta teve uma inspiração progressista, com o correr dos dias se viram grupos dizendo “Lula vai pra Cuba” e até quem reivindicou os militares.

– Seguramente essas pessoas foram aparecendo nas manifestações, vemos esses grupos com muito cuidado, para que não tomem conta da manifestação, mas em nenhum momento o sentido amplo, social, de esquerda se perdeu. Acho que se mantém o controle político das mobilizações, mas nós não somos a direção de tudo isso.

– O MPL se define como uma organização que faz uso da violência política?

– A violência existe desde o Estado que nos impõe esse transporte, essa educação, e nós nos opomos a aceitar essas imposições que parecem algo natural. Nosso lema é “se a passagem não baixar, a cidade vai parar”, nós utilizamos uma violência política para impedir o funcionamento da cidade, não estamos a favor de agredir ninguém, nem atacar prédios públicos. É uma violência que está no símbolo da ruptura da roleta, violência contra uma cidade onde as pessoas circulam como mercadorias. O discurso da paz esconde as contradições da sociedade, nós estamos contra este discurso pacifista da imprensa hegemônica. A realidade é que não existe paz, o Estado manda a polícia matar na periferia, os hospitais matam as pessoas com um mau serviço.

Os garotos do MPL, em geral não passam de 25 anos, são um sucesso midiático no Brasil e na imprensa internacional, onde ainda prevalece a matriz de opinião anglo-saxã que equipara o fenômeno brasileiro com a “primavera árabe” sem reparar em outras analogias existentes na América Latina.

– O caso brasileiro é o suficientemente eclético, mas não seria mais apropriado compará-lo com o processo encabeçado pelos jovens “pinguins” do Chile antes que com o mundo árabe?

– É verdade, há comparações erradas. Eu não discuti isso com meus companheiros, mas acho que talvez seja mais preciso ser comparado com os estudantes chilenos que com os jovens árabes, porque nós como os chilenos lutamos por uma agenda pontual, eles pela educação gratuita e pública, nós aqui pelo transporte. Nós não vamos à rua como os árabes que iam contra algumas ditaduras, contra o sistema. Nós usamos um método parecido ao dos chilenos, enfrentar todo o Estado em um ponto claro, o transporte, com ações diretas. No Chile se inviabilizou o funcionamento das universidades, em São Paulo a cidade deixou de funcionar. Nós não pedimos a queda de Dilma como os egípcios que pediam a saída de (Hosni) Mubarak.

Depois do transporte, outra demanda cada vez mais estendida nas manifestações é o repudio aos gastos excessivos e nem sempre transparentes com a Copa das Confederações, que terminou com o choque entre o Brasil e a Espanha, no Maracanã.

– É curioso que no país do futebol exista tamanho protesto contra a Copa.

– Nós estamos vendo que isso foi crescendo em cada jogo da Copa das Confederações.

Há dois meses havia mobilizações fortes no Rio contra o dinheiro gasto para reformar o Maracanã, pelo desalojo dos indígenas (ocupantes de um prédio que deve ser demolido), mas não se pode comparar com o que poderia acontecer no domingo na final. Também se soma a indignação pelo massacre de 10 pessoas na favela da Maré. No Rio a princípio as manifestações eram de classe média, agora começa a se somar a periferia. O mesmo está acontecendo em São Paulo, nas últimas marchas vimos que começou a somar-se muita gente que vem dos movimentos de bairros do leste, onde estão as favelas mais importantes.

– Pelé recomendou não ir às manifestações e ver os jogos em casa.

– Isso mostra sua falta de compromisso completo com a realidade política que está aparecendo em todas as partes. É uma pena que uma figura pública importante esteja incentivando as pessoas a não se manifestarem, que considere que seja mais importante o futebol que as reivindicações sociais.
Eu gosto de futebol, não sou torcedor, gosto de jogar, mas isso do Pelé eu não gostei nem um pouco.

@DarioPignotti

Tradução: Liborio Júnior

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