William S. Burroughs[1]
Existe um interesse crescente por novas técnicas de controle da mente. Dizem que Sirhan Sirhan[2] foi  objeto de absorção pós-hipnótica; ele se senta tremendo violentamente  na mesa de vapor da cozinha do Hotel Ambassador, em Los Angeles,  enquanto a mulher ainda não identificada segurava-o e sussurrava em seu  ouvido. Alega-se que as técnicas de modificação de comportamento são  usadas em prisioneiros problemáticos ou em pessoas internadas, muitas  vezes sem as suas aceitações. Dr. Delgado[3],  que uma vez capturou um condenado touro por controle remoto, a partir  de eletrodos no cérebro do animal, deixou os EUA para prosseguir os seus  estudos em seres humanos na Espanha. Lavagem cerebral, drogas  psicotrópicas, lobotomia e outras formas mais sutis de psicocirurgia: os  aparatos de controle tecnocrático dos Estados Unidos têm obtido novas  técnicas, em que, se bem exploradas, podem deixar o 1984 de G. Orwell  parecendo uma utopia benevolente.Contudo, as palavras são ainda os  principais instrumentos de controle. Proposições são palavras. Persuasão  são palavras. Ordens são palavras. Nenhuma máquina de controle até  agora planejada pode operar sem palavras, e qualquer máquina de controle  que tenta fazê-la dependerá inteiramente de força externa ou  inteiramente de controle físico da mente – e, tão logo, encontrará  limites de controle.
Um embaraço básico de todas as máquinas  de controle é este: controle necessita de tempo para exercer o controle.  Isto porque controle também necessita de oposição ou de assentimento;  caso contrário, deixa de ser controle. Eu controlo um sujeito hipnotizado (pelo menos parcialmente); eu controlo um escravo, um cão, um trabalhador, mas se eu estabeleço o controle completo de  alguma forma, como por meio da implantação de eletrodos no cérebro,  então o meu subordinado é um pouco mais que um gravador, uma câmera, um  robô. Você não controla um aparelho gravador – utiliza-o.  Considere a distinção e o impasse implícito aqui. Todos os sistemas de  controle tentam fazer o controle o mais estreito possível, mas, ao mesmo  tempo, se o conseguisse completamente não haveria mais nada para  controlar. Suponhamos, por exemplo, um sistema de controle que instala  elétrodos nos cérebros de todos os futuros trabalhadores bem no momento  do nascimento. Controle então está completo. Mesmo o pensamento de  rebelião é neurologicamente impossível. Nenhuma força policial é  necessária. Nenhum controle psicológico é preciso, a não ser pressionar  os botões certos para alcançar certas ativações e operações. Os  controladores poderiam ligar a máquina, e os trabalhadores iriam  realizar suas tarefas, pelo menos eles poderiam pensar assim. Porém, os  controladores pararam de controlar os trabalhadores, uma vez que estes  se transformaram em algo como um aparelho gravador.
Quando não há mais oposição, o controle é  uma proposição sem sentido. É altamente duvidoso que um organismo  humano possa sobreviver em controle completo. Não teria mais nada lá.  Não teria indivíduo. A vida é vontade, motivação, e os trabalhadores não seriam mais vivos, quiçá literalmente. O conceito de absorção (suggestion),  enquanto uma técnica de controle, pressupõe controle parcial e não  total. Você não tem como reprimir o seu gravador nem submetê-lo à dor,  coerção ou persuasão.
No sistema de controle maia, no qual os  sacerdotes conservavam os louvados Livros das Estações e dos Deuses, o  calendário impetrava o analfabetismo universal, na medida em que operava  como meio de comunicação de massa – um instrumento de controle de dois  gumes, como Watergate se mostrou. Os sistemas de controle são  vulneráveis, e as novas mídias são incontroláveis por natureza, pelo  menos na sociedade ocidental. A imprensa alternativa é notícia, a  sociedade alternativa é notícia, e, como tal, ambas são absorvidas pelos  meios de comunicação. Uma vez que Hearst e Luce obtiveram o monopólio  de Hearst e Luce, este foi quebrado. De fato, quanto mais completamente  hermético e aparentemente bem sucedido é um sistema de controle, mais  vulnerável ele se torna. A fraqueza inerente do sistema maia é que ele  não precisa de um exército para controlar os seus trabalhadores; e,  portanto, não precisa de um exército quando, na verdade, eles  precisariam de um para repelir os invasores. É regra das estruturas  sociais dizer que qualquer coisa que não é necessária irá se atrofiar e  se tornar inoperativa ao longo do tempo. Retiram-se do jogo de guerra –  lembrem-se, os maias não tinham vizinhos para brigar com eles – logo  perdem a capacidade de lutar. Em The Mayan Caper [4] eu  sugeri que tal hermético sistema de controle poderia ser completamente  desorientado e abalado por uma única pessoa que alterasse o controle do  calendário em que o sistema de controle dependia tanto mais e mais  fortemente. De tal maneira, suas mídias definhariam.
Considere uma situação de controle: dez  pessoas em um barco salva-vidas. Dois autointitulados líderes armados  forçam os outros oito a remarem enquanto os líderes dispõem do alimento e  da água, mantendo a maior parte para eles e distribuindo apenas o  suficiente para manter os outros oito remando. Os dois líderes agora precisam exercer  controle para manter uma posição vantajosa que não poderia manter sem  isto. Aqui, o método de controle é a força – a posse de armas.  Descontrole seria efetuado pelo desgoverno dos líderes e a tomada de  suas armas. Feito isto, seria vantajoso matá-los de uma vez. Logo que  iniciado uma política de controle, os líderes iriam continuar com a  política por uma questão de autopreservação. Quem precisa controlar os  outros, a não ser aqueles que resguardam, com tal controle, uma posição  de vantagem relativa? Por que eles precisam exercer o controle? Ora,  eles precisariam controlar porque se eles resignassem ao controle eles  teriam, imediatamente, perdido a posição de vantagem e, em muitos casos,  teriam também perdido suas vidas.
Agora examine as razões pelas quais o  controle é exercido no cenário barco salva-vidas: os dois líderes estão  armados, digamos, com revólveres calibre 38 – doze tiros e oito  oponentes em potencial. Eles poderiam dormir em turnos. No entanto, eles  ainda deveriam ter o cuidado para não deixar os oito remadores terem a  intenção de matá-los quando a terra fosse avistada. Mesmo nesta selvagem  situação, a força é processada por decepção e persuasão: os líderes vão  desembarcar no ponto A e explicam que deixam alimento suficiente para  os outros atingirem o ponto B. Eles têm a bússola e estão contribuindo  com suas habilidades de navegação. Em resumo, eles irão se esforçar para  convencer os outros de que este é um empreendimento cooperativo, em que  todos estão trabalhando para o mesmo objetivo. Eles também podem fazer  concessões: aumentar as rações de alimento e água. A concessão  significa, é claro, a retenção do controle – isto é, a disposição dos  alimentos e da água. Por persuasões e por concessões, eles esperam  evitar um ataque conjunto dos oito remadores.
Na verdade, eles pretendem envenenar a  água potável tão logo que deixarem o barco. Se todos os remadores  soubessem disto, eles teriam atacado, não importa de que maneira. Vemos  agora que outro fator essencial do controle é ocultar aos controlados as  intenções reais dos controladores. Estendendo a analogia do barco  salva-vidas para o Navio do Estado, poucos governos existentes poderiam  resistir a um súbito ataque em massa de todos os seus cidadãos  desfavorecidos, e tal ataque poderia ocorrer se as intenções de certos  governos existentes fossem inequivocamente manifestas. Suponha que os  líderes do barco salva-vidas tivessem construído uma barricada e  poderiam resistir a um ataque concentrado e matar todos os oito  remadores, se necessário. Eles teriam então que remarem por si mesmo e  nem estariam seguros um do outro. Da mesma forma, um governo moderno  armado com armas pesadas e preparado para o ataque poderia acabar com  95% dos seus cidadãos. Mas quem faria o trabalho, e quem iria  protegê-los dos soldados e técnicos necessários para fazer homens e  armas? Controle bem sucedido significa obter um equilíbrio e evitar um  confronto no qual todas as forças fossem necessárias. Isto é conseguido  por meio de várias técnicas de controle psicológico, também  equilibradas. As técnicas tanto de força como de controle psicológico  são constantemente incrementadas e refinadas, e mesmo assim a  dissidência em todo o mundo nunca foi tão generalizada nem tão perigosa  para os controladores atuais.
Todos os modernos sistemas de controle  estão cheios de contradições. Olhe para a Inglaterra. “Nunca vá longe  demais a qualquer direção”, é a regra básica na qual a Inglaterra é  edificada, e há alguma sabedoria nisso. No entanto, evitando um impasse  eles entram em outro. Qualquer coisa que está indo agora além já  encontra as margens. Certo, nada dura para sempre. O tempo determina o  que termina, e controle precisa de tempo. A Inglaterra está simplesmente  tentando ganhar tempo em virtude dos seus lentos fundadores. Olhe para a  América. Quem realmente controla este país? É muito difícil dizer.  Certamente os muito ricos são um dos grupos mais poderosos de controle,  uma vez que eles estão em posição de controlar e manipular toda a  economia. No entanto, não consistiriam vantagens para eles configurarem  ou tentarem formar um governo excessivamente fascista. Força, uma vez  implantada, subverte o poder do dinheiro. Este é outro impasse do  controle: a proteção dos protetores. Hitler formou a SS para protegê-lo  da S.A. Se ele tivesse vivido o suficiente teria colocado o problema da  proteção da própria S.S. Os imperadores romanos estavam à mercê da  Guarda Pretoriana, que em um ano assassinou vinte imperadores. E, além  disso, nenhum país industrial moderno foi fascista sem um programa de  expansão militar. Não há mais lugar algum para se expandir – depois de  centenas de anos, o colonialismo é uma coisa do passado.
Não pode haver dúvida de que uma  revolução cultural sem precedentes aconteceu na América durante os  últimos trinta anos e, uma vez que a América é agora o modelo para o  resto do mundo ocidental, esta revolução é mundial. Outro fator é a  mídia de massa, que espalha em todas as direções diversos movimentos  culturais. O fato de que esta revolução mundial ocorreu indica que os  controladores foram obrigados a fazer concessões. Evidentemente, uma  concessão é ainda retenção de controle. Aqui está um centavo, eu guardo  um dólar. Facilita-se via censura, mas lembremos, nós pudéssemos ter  isso tudo de volta. Bem, neste ponto que é questionável.
Concessão é outra conexão de controle. A história mostra que tão logo um governo começa a fazer concessões, é uma rua de mão única. Certamente, eles poderiam ter todas as concessões de volta, mas os sujeitariam ao duplo perigo da revolução e do muito maior perigo do fascismo escancarado, ambos altamente arriscados para os controladores atuais. Será que aparece qualquer política clara a partir desta entretida confusão? A resposta é provavelmente não. Os meios de comunicação têm se mostrado um instrumento de controle muito instável e até traiçoeiro. Isto devido à sua necessidade incontrolável por NEWS. Se um documento, ou mesmo uma série de documentos de propriedade da mesma pessoa, faz com que a história seja mais quente como NEWS, alguns outros documentos serão procurados. Qualquer imposição de censura do governo sobre a mídia é um passo na direção do controle do Estado, um passo que é fica mais restritivo para obter big Money.
Concessão é outra conexão de controle. A história mostra que tão logo um governo começa a fazer concessões, é uma rua de mão única. Certamente, eles poderiam ter todas as concessões de volta, mas os sujeitariam ao duplo perigo da revolução e do muito maior perigo do fascismo escancarado, ambos altamente arriscados para os controladores atuais. Será que aparece qualquer política clara a partir desta entretida confusão? A resposta é provavelmente não. Os meios de comunicação têm se mostrado um instrumento de controle muito instável e até traiçoeiro. Isto devido à sua necessidade incontrolável por NEWS. Se um documento, ou mesmo uma série de documentos de propriedade da mesma pessoa, faz com que a história seja mais quente como NEWS, alguns outros documentos serão procurados. Qualquer imposição de censura do governo sobre a mídia é um passo na direção do controle do Estado, um passo que é fica mais restritivo para obter big Money.
Eu não quero sugerir que o controle  automaticamente destrua a si mesmo, nem que o protesto seja, portanto,  desnecessário. Nada pode ser mais perigoso do que um governo que embarca  em autodestruição ou a um curso inteiramente suicida. É encorajador que  alguns projetos de modificação de comportamento têm sido noticiados e  cessados, e certamente essa exposição e publicidade vão continuar. Na  verdade, eu defendo que nós tenhamos o direito de insistir que toda pesquisa científica seja sujeita ao escrutínio público, e que não deve haver tal coisa como pesquisas top-secret.
[1] Texto publicado originalmente na revista Semitotex(e), vol.3, n° 02, New York, 1978, p.38-43.
[2] Sirhan Sirhan (1944), nascido em Jerusalém e refugiado nos EUA, foi condenado pelo assassinato Robert Francis Kennedy, irmão do presidente americano John Fitzgerald Kennedy (NdT).
[3] Professor José Manuel Rodriguez Delgado (1915-2011), da Universidade de Yale, ganhou notoriedade nos anos 1960 por realizar experimentos de implantes de rádio transmissor (stimoceiver) em cérebros de animais, de modo que pudesse controlar movimentos destes (NdT).
[4] Capítulo do livro “The Soft Machine”, publicado pela editora Grove Press, 1992 [1961, 1966] (NdT).

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