A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

5 de dezembro de 2016

trago em meus joelhos

trago em meus joelhos
o testemunho das quedas passadas
e os olhos enfermos da noite

sou uma saudade envelhecida
onde deuses construíram um abismo

cada músculo do meu corpo
é uma ilha feita de cicatrizes
todas banhadas na nossa antiga desordem

as sílabas destes versos ainda chamam teu nome
vocábulo feito guilhotina escrito na calçada de casa
tumor animal que não curei

que fiquei com tua mandíbula irrepetível em meus seios
estou sempre onde poderia ter sido

o meu sangue, uma geografia acidentada
onde eu mesma mal respiro
onde, na tontura, transbordamento e vazio
se confundem

a cada noite eu temo que não amanheça
mas há pássaros que cantam no meu temor
sinto que estou grávida de tantos sóis

não importa como, sempre haverá a queda
cancro que nunca sara, nunca se despede

ontem a noite,
martelei uma Olivetti até que nela aparecesse minha própria ruína
sei que agora posso ser noite sem o terror de doer.

Raquel Gaio

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