A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

4 de abril de 2020

arqueologia delirante 2

no fundo do terreno
havia o museu dos mortos

árvores avançam
infiltrando-se por dentro das paredes

as paredes vivas
com artérias
estourando os rebocos
engolindo as janelas
aflorando
na epiderme dos tijolos

as escadas saltam
como costelas quando em corpos magros
desejam o que há de horizonte no cansaço
carregam o peso dos que sobem
alimentam a lembrança com seu abandono
é preciso lembrar todas as tragédias
inaugurar uma arqueologia delirante
que atinge as camadas tectônicas
para decompor o campo
compor com lascas
estranhas barricadas

por trás do som
habita a mecânica do hino

qual o jogo que está em jogo?

os uniformes uniformizam

ao logo da fronteira invisível
fileiras e fileiras de sentinelas cegos
que não raro perdem a esportiva
Salvador Passos

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