A Caverna

Esta é a caverna, quando a caverna nos é negada/Estas páginas são as paredes da antiga caverna de novo entre nós/A nova antiga caverna/Antiga na sua primordialidade/no seu sentido essencial/ali onde nossos antepassados sentavam a volta da fogueira/Aqui os que passam se encontram nos versos de outros/os meus versos são teus/os teus meus/os eus meus teus /aqui somos todos outros/e sendo outros não somos sós/sendo outros somos nós/somos irmandade/humanidade/vamos passando/lendo os outros em nós mesmos/e cada um que passa se deixa/essa vontade de não morrer/de seguir/de tocar/de comunicar/estamos sós entre nós mesmos/a palavra é a busca de sentido/busca pelo outro/busca do irmão/busca de algo além/quiçá um deus/a busca do amor/busca do nada e do tudo/qualquer busca que seja ou apenas o caminho/ o que podemos oferecer uns aos outros a não ser nosso eu mesmo esmo de si?/o que oferecer além do nosso não saber?/nossa solidão?/somos sós no silêncio, mas não na caverna/ cada um que passa pinta a parede desta caverna com seus símbolos/como as portas de um banheiro metafísico/este blog é metáfora da caverna de novo entre nós/uma porta de banheiro/onde cada outro/na sua solidão multidão/inscreve pedaços de alma na forma de qualquer coisa/versos/desenhos/fotos/arte/literatura/anti-literatura/desregramento/inventando/inversando reversamento mundo afora dentro de versos reversos solitários de si mesmos/fotografias da alma/deixem suas almas por aqui/ao fim destas frases terei morrido um pouco/mas como diria o poeta, ninguém é pai de um poema sem morrer antes

Jean Louis Battre, 2010

22 de março de 2017

A Batida da Porta


A batida da porta é uma máquina
de pensar
melhor seria não pensar
porque pensar cansa
A batida da porta é apenas uma
batida de porta
pensar-batida
porque pensar é bater
A batida da porta não é apenas
uma batida de porta
é uma pessoa indo embora
porta-pessoa
A batida a porta
você pensando em ir embora
A batida da porta é uma máquina
uma cena
você não volta
você pensa
você cansa
você é a máquina de pensar em você
a batida da porta
a máquina-porta
você nunca volta
eu sabia
Eu vi a porta fechada atrás de você
a escada o portão
a máquina de pensar – nessa hora você se vira
pensa olha para trás
cala a boca
você não é uma porta
uma máquina de bater
Eu penso de porta fechada
na batida das coisas
na máquina
E você não pensa
você cansa
você isso você aquilo
etc. etc.
Porque vestido de porta
você é madeira
compensado
você porta
você você
uma máquina de você
Eu pensando em bater porta
a batida da máquina
que lembra
pensando por que sim
pensando por que não
a máquina das coisas
me cansa
A batida da porta é a porta
fechada
alguém dentro
alguém fora
alguém-alguém
A batida da porta é uma máquina
de lembrar
mas lembrar cansa
uma máquina cansa
você cansa
alguém dentro cansa
eu-trancado
A batida da porta é ninguém
escuta
ninguém abre
você bate lembra
ninguém lembra
você cansa
eu-porta
A batida da máquina é lembrar com
defeito
uma porta fechada
você engoliu a chave
eu engoli a chave
você-trancado
eu-dentro
Escuta
em algum momento
você imaginou
alguém trancado por fora
uma porta
que abre ao contrário
o caminho da chave
por dentro
um mal-estar
a porta-paisagem
eu-alguém do outro lado
deu com a cara na porta
você-alguém dentro
Escuta
cuidado com o vão
mind the gap
Eu penso de porta fechada
na batida das coisas
na máquina
no mapa que a batida desenha
na cara de alguém
Escuta
cuidado com o vão
lembra
e bate
A batida da porta é só uma
batida de porta
Mas aí alguém atribui um
sentido
você atribui
bate lembra
E a batida da porta não é só
batida
É alguém indo embora
é a fatia da pizza que sobra
é alguém falando sozinho
É o branco sobre branco do pintor
russo
é o espaço vazio na cama
é alguém copiando cem vezes um nome
num caderno verde
e depois riscando
cem vezes um nome
É isso aquilo
é um fiozinho de vida
a capacidade assustadora de esquecer
lembrar
lembrar que esqueceu
É um alívio
é um batente solto
é você repetindo a palavra “batente”
É a mensagem que não
chega
é a batida da porta inclusive
é a canseira
Espera
consegue ouvir
Não
mas vejo a porta fechada atrás de você
a escada o portão
a máquina de lembrar – nessa hora você se vira
pensa olha para trás
cala a boca
A batida da porta não é só batida
É um parafuso perdido
na rua
é uma fotografia e você nela
é uma máquina parada
é alguém que desafina
É você-trancado
o lado de dentro
o lado de fora
um filme em construção
é a primeira vez que te vi
Escuta
como isso tudo
dispara em mim
e fecha 

Franklin Alves Dassie

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